A quarenta anos do homem na Lua

Apesar de motivada pela disputa com o programa espacial soviético, a chegada do homem à Lua impulsionou a ciência e o desenvolvimento tecnológico, mostrando o que poderia ser feito caso estes não estivessem a serviço do capitalismo


Jeferson Choma
da redação do Opinião Socialista







• Neste mês completam-se os 40 anos da primeira viagem do homem à Lua. Foi em 16 de julho de 1969 que a nave espacial Apollo 11 partiu do Cabo Canaveral. A bordo estavam os astronautas Neil Armstrong, Edward “Buzz” Aldrin e Michael Collins. Os dois primeiros desceram rumo à superfície no Módulo Lunar.

A chegada do homem à Lua foi motivada pela intensa polarização entre os Estados Unidos e União Soviética. O imperialismo norte-americano investiu alto para superar a URSS na chamada “corrida espacial”.

Na década anterior, apesar da burocratização stalinista, o Estado operário soviético dava mostras da superioridade da economia planificada, livre das amarras do capitalismo. Em 1957, os soviéticos colocam em órbita o primeiro satélite da humanidade, o Sputnik. E depois a cadela Laika, o primeiro ser vivo a entrar em órbita. Em 1961, realizam um feito ainda mais notável: o cosmonauta Iuri Gagarin é o primeiro ser humano a viajar ao espaço e proclama que “a Terra é azul”. Um feito admirável para um país que 40 anos antes tinha cerca de 90% da população analfabeta.

Nas comemorações dos 40 anos da conquista da lua, é importante ressaltar também os avanços do programa espacial soviético que mostrou a superioridade impressionante da economia planificada.

Desde o início, a “corrida espacial” era extremamente desigual. Como potência imperialista hegemônica, os EUA tinham a seu dispor todo o parque produtivo do planeta. Já a URSS estava isolada e tinha acabado de superar os resquícios feudais de um enorme atraso econômico e cultural. O maior obstáculo ao programa espacial soviético, porém, (e do conjunto das suas pesquisas cientificas) foi justamente o isolamento da URSS, provocado pela política stalinista do “socialismo em um só país”. Se a economia planificada substituísse a propriedade capitalista em escala mundial, a URSS (e outras nações não-capitalistas) poderiam ter mobilizado o conjunto das potencialidades humanas a serviço de um amplo desenvolvimento das ciências. No entanto, o impressionante é que apesar destas limitações, a URSS foi pioneira na corrida espacial.

A resposta norte-americana ao avanço russo foi dada em 1961 pelo presidente dos Estados Unidos, John Kennedy, que prometeu levar astronautas norte-americanos à Lua “até o final da década”. Cansados de apanhar dos soviéticos, resolveram criar o programa Apolo.

A prioridade do programa, porém, não foi o experimento cientifico, mas sim político e militar (o desenvolvimento de foguetes e mísseis). Além, é claro, da viagem à Lua, que serviria como peça de propaganda contra a União Soviética.

Por outro lado, muitos cientistas e físicos discordavam do projeto. Opinavam que o envio de missões não tripuladas seriam mais baratas e seguras e que o dinheiro gasto com o projeto Apolo poderia ter sido investido em coisas mais importantes da pesquisa cientifica. O projeto Apolo foi extremamente caro (as missões custaram US$ 150 bilhões, em valores de hoje). É comparável apenas ao projeto Manhattan, que desenvolveu a primeira bomba atômica. Além disso, havia um enorme risco em enviar uma tripulação à Lua. Só pra citar um exemplo, o modulo lunar utilizado por Armstrong e “Buzz” Aldrin foi testado pela primeira vez em apenas solo lunar, pois sua fragilidade era tamanha que não permitia que nenhum teste fosse realizado sob a gravidade da Terra. Se estivessem em vigor as regras de segurança atuais, a viagem teria sido cancelada.

Para o célebre físico Carl Sagan, ir até a Lua não passava de uma bobagem. Como muitos cientistas da época, ele questionava as missões tripuladas e não concordava com sua utilização política contra os soviéticos. Mas como bom cientista, Sagan não deixou a oportunidade passar e colaborou intensamente com o projeto Apollo. Anos depois tornou-se um dos mais prestigiados diretores da NASA.

Assim, depois de um grande esforço científico, os norte-americanos construíram uma máquina capaz de atravessar os 386 mil quilômetros que nos separam da Lua, pousar suavemente em solo lunar, colher amostras do solo e ainda voltar para casa em segurança. Esse feito extraordinário foi repetido por apenas 12 homens em outros cinco desembarques, entre 1969 a 1971.

Desenvolvimento tecnológico
Do ponto de vista cientifico, as pesquisas que levaram a viagem lunar, assim como as conquistas do programa soviético, proporcionaram um extraordinário desenvolvimento tecnológico. O fato de você estar lendo esse artigo através de seu computador ou de falar ao telefone celular é, em grande parte, resultado dessas expedições.

A comunicação via satélite, o desenvolvimento de computadores pessoais, o monitoramento das condições meteorológicas, o surgimento de materiais sintéticos resistentes, entre muitas outras conquistas, são heranças diretas da corrida espacial. Além do mais, a viagem à Lua em particular permitiu satisfazer um pouco a curiosidade da espécie humana sobre o universo e o próprio planeta. A coleta e análise do solo lunar desvendaram boa parte da composição do sistema solar, apresentando novas hipóteses sobre a sua criação.

No entanto, depois que o governo dos EUA obteve os dividendos políticos que desejava, o projeto Apollo foi prematuramente cancelado. "Justo agora que estamos fazendo descobertas!", protestou Sagan.

Apesar de tudo isso, o legado humano da chegada à Lua não foi ofuscado. Ao lado das conquistas soviéticas, a missão Apollo mostrou que seres humanos poderiam sair da Terra e chegar a outro corpo celeste. Que a humanidade podia vencer o desafio de construir máquinas complexas, superar barreiras imagináveis e viajar ao espaço. A Lua estava ao nosso alcance. E esse foi a primeira e humilde demonstração de que é possível conquistar o Cosmos.

Galileu teria gostado de ver a exibição. Há 400 anos ele apontava sua luneta para o céu, observando pela primeira vez na história as imperfeições do solo lunar. As observações arruinaram completamente as bases da “concepção aristotélica” da Física sustentadas na época pela Igreja Católica.

O programa espacial depois
Depois do cancelamento do programa Apollo, a NASA passou por altos e baixos. Cada vez mais a agência perdia seu caráter cientifico e sofria com a ingerência dos militares. Novamente, Carl Sagan denunciou essa transformação. Criticou o cancelamento de projetos de caráter cientifico e o desvio de dinheiro para desenvolver o ônibus espacial. As criticas eram dirigidas ao desvio de recursos para projetos militares, como mísseis e satélites espiões, além do programa “Guerra nas Estrelas”.

Um exemplo claro foi o programa dos ônibus espaciais. Originalmente o projeto era extraordinário porque procurava tornar viagens ao espaço seguras, simples e baratas (daí o nome de ônibus). No entanto, os militares colocaram seu dedo no projeto e fizeram uma série de exigências, como por exemplo, construir uma nave muito maior do que o projeto original para levar satélites militares espiões ao espaço. Isso exigia um grande compartimento de carga. Ao final, tornaram o projeto do ônibus espacial no seu oposto; perigoso, complicado e caríssimo.

O tempo se encarregou de mostrar que essas críticas estavam certas. O ônibus espacial foi um fracasso em termos de segurança. A cada voo as naves sofrem intensos desgastes e se deterioram. Dos cinco ônibus construídos, dois explodiram matando toda a tripulação (os acidentes mais graves de história da engenharia aeroespacial). O que foi um verdadeiro contraste com a velha e segura Soyos, nave soviética utilizada desde 1967 e que registrou apenas um acidente.

Por outro lado, a militarização da NASA não impediu que ela conquistasse resultados notáveis na aérea científica: o lançamento da Mariner 9, a sonda espacial que voou ao redor de Marte em 1971; os lançamentos da Pioneer 10, primeira sonda a passar próximo a Júpiter, em 1973, e da Pioneer 11, que foi à Saturno; a Viking 1, que pousou em Marte; e finalmente as Voyager 1 e 2 (1977), que passaram por Júpiter, Saturno, Urano, Netuno e Titã. Se os recursos não tivessem sido destinados para a área militar, a pesquisa cientifica teria avançado ainda mais.

Paralelamente, a tecnologia confiável do programa soviético também acumulava avanços: A construção dos foguetes Proton (utilizados até hoje), as sondas espaciais como a Venera, que foi a Venus, e pela primeira vez a construção de uma estação espacial, a MIR.

É evidente o retrocesso atual de ambos os programas espaciais. A restauração do capitalismo na URSS desintegrou seu programa espacial. Para se sustentar minimamente, os russos são obrigados a enviar “turistas” milionários que pagam uma fortuna para ir ao espaço. A NASA também sofreu duros golpes. Dos anos 70 pra cá, a parcela do orçamento norte-americano destinado à agência espacial caiu de cerca de 4% para meros 0,6%. Hoje o projeto espacial norte-americano está no fundo do poço e ironicamente depende dos foguetes russos para ir ao espaço.

Quarenta anos após ir à lua, o capitalismo mostra claramente o retrocesso nas áreas da pesquisa espacial. Sob esse sistema, a pesquisa cientifica a serviço do bem estar do ser humano é sobrepujada pelo desenvolvimento da forças destrutivas da humanidade.